Estratégia militar
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Estratégia militar
Nota Introdutória
A Revolução Francesa e mais concretamente as Campanhas Napoleónicas, que se prolongaram entre 1796 e 1815, são referidas por muitos pensadores militares como os principais acontecimentos charneira que determinaram, a forma de estudar a arte da guerra. Não só pela preponderância do génio militar de Napoleão e do seu corpo de Generais, mas principalmente pela repercussão que estas campanhas militares épicas tiveram na doutrina táctica e na estratégia militar. De um período histórico em que a actividade bélica constituía um assunto privado dos soberanos e dos seus Exércitos, em que apenas estes estavam vocacionados para reflectir e escrever sobre a arte da guerra, passaram a existir outros intervenientes. Esta actividade passou a constituir tema de reflexão social e motivo de escritos académicos. A guerra passou a ser um assunto transversal no seio das sociedades, envolvendo múltiplos actores conjunturais. Conflitos que mobilizavam as nações e a sua população por inteiro, retratado no lema proferido por Napoleão “…levée en masse…”. Passava a assistir-se à inclusão de um inovador conceito de “liberalismo militar”, extremado na essência de um “militarismo liberal que inundava o pensamento de políticos, sociólogos, historiadores e estrategas militares.
Decorrentes das Campanhas Napoleónicas, cujos efeitos directos e indirectos assolaram a maioria dos países da Europa no início do Século XIX, surgem diversos teorizadores e pedagogos da arte da guerra. Destes importa destacar, pela profundidade das suas obras e pela relevância do seu pensamento, duas personagens que marcaram uma época e contribuíram para a conceptualização de uma doutrina estratégica e militar inovadora - Carl Philipp Gottlieb von Clausewitz e o Barão Antoine Henri Jomini. Embora tenham ambos ascendido ao posto de General, nunca chegaram a comandar tropas em combate, desempenhando essencialmente funções de Estado-Maior e de assessoria político-militar ao mais alto nível, principalmente no Exército Prussiano e no Exército Francês, respectivamente, tendo ambos, em determinado período da sua vida militar servido no Exército Russo. Contudo, resultante da experiência acumulada no desempenho destas distintas funções, beneficiou de uma partilha de conhecimentos e de uma visão estratégica das operações da guerra, inclusive na vertente logística e jurídica, o que aliado ao espírito critico, analítico e indutivo, bem como ao apurado estudo histórico das batalhas e das campanhas militares, permitiu que compusessem obras respeitantes ao estudo da guerra, cujo teor, princípios e clareza das visões apresentadas, salvaguardando as devidas actualizações resultantes da evolução tecnológica e das ideologias modernas, se mantêm actuais e se constituem em grande medida, nas linhas orientadoras de planeamento e de conduta dos Exércitos modernos em operações militares.
Antoine Henri Jomini, cuja vida, obra e legado pensamento estratégico, pontificam no dia-a-dia de muitos manuais de estratégia militar, não parece ter recebido o reconhecimento e protagonismo que poderia merecer. Esta reflexão que aqui partilhamos é uma oportunidade para descobrir o génio militar de Jomini, e é simultaneamente uma dedicatória ao seu protagonismo como homem, estadista e militar, pois que as suas contribuições no campo da Estratégia3, da Táctica4, da Arte Operacional e da Logística5 (termo de sua autoria), a sua criação de modelos de análise, a sua capacidade de antevisão e o seu conceito inovador das relações civis-militares, que serão objecto de análise, constituem o seu referencial ideológico sobre a arte da guerra. Dada a contemporaneidade com Clausewitz, bem como a grandeza das suas obras e ainda a forma como estes dois estrategistas complementaram os seus pensamentos estratégicos, é de capital importância verificar que, embora tenham combatido em facções opostas das Campanhas Napoleónicas, alguns dos seus principais conceitos gerais e ideologias sobre a conduta operacional das batalhas, se aproximam ou mesmo coincidem, noutros divergem e outros há ainda em que se complementam.
Um breve apontamento biográfico
O Barão Antoine Henri Jomini nasceu a 6 de Março de 1779, na localidade de Payerne, na Suíça (República Helvética). Desde cedo revelou inclinação pela carreira militar, mas tanto o pedido do seu pai, um político regional e nacional, como os acontecimentos conjunturais resultantes da Revolução Francesa, demoveram-no do seu objectivo, optando antes por se tornar um economista e banqueiro. Para tal, recebeu formação em finanças e actividades bancárias nas cidades de Aarau e Basel, tendo posteriormente rumado a Paris onde trabalhou na banca durante cerca de dois anos. Após este curto período, decidiu tentar a sua sorte como corrector na Bolsa de Paris em 1798, durante o qual ficou fortemente influenciado pelos nobres ideais da Revolução Francesa e deslumbrado pelos feitos militares conseguido por Napoleão Bonaparte. Redige em Paris o “Jornal des Operations Militaires” e o “Histoire critique et militaire des Campagnes de la Révolution, de 1792 à 1801”, tendo como base a observação atenta das manobras militares. Estas obras constituíram-se nas primeiras referências bibliografias relacionada com a sua reflexão sobre o fenómeno da guerra. Entretanto, na Suíça, as tropas francesas tinham libertado zonas subjugadas por regimes aristocráticos e imposta uma Constituição Republicana e um Governo Central à Confederação Suíça. Aos vinte anos, em 1799, Jomini ingressou no Ministério da Guerra da recém- criada República Helvética como tenente Ajudante de Campo do Ministro da Guerra Helvético, vindo a ser promovido a capitão em 17 de Junho desse mesmo ano, e assumindo a função de Chefe de Secretaria do Ministério da Guerra Helvético, onde se dedicou à criação, organização e administração de um novo Exército para a defesa de uma Suíça devastada pela guerra civil, tendo publicado neste período os seus primeiros escritos militares sobre o Exército Helvético em 1800.
Em 1801, Jomini ruma novamente a Paris, com o propósito de finalmente ingressar na carreira militar, altura em que recomeça as suas pesquisas em História Militar e mais concretamente no estudo de batalhas, escrevendo sobre a Arte da Guerra, a sua primeira obra de referência internacional, o “Traité de Grande Tactique”, mais tarde apelidado de “Traité des Grandes Opérations Militaires”, editado em 5 volumes, em 1805. É porém o Marechal Michael Ney que ao ler o manuscrito de Jomini sobre o “Traité de Grande Tactique”, em 1804, resolve apoiar a sua publicação, propondo ainda a sua nomeação para integrar o seu Estado-Maior como Ajudante de Campo Adjunto, proporcionando-lhe a oportunidade de iniciar uma carreira militar. Veio a juntar-se ao Estado-Maior do Marechal Michael Ney em 3 de Março de 1805, revelando-se sob o seu comando, um exímio planeador e um estratega militar de referência.
O ambiente da Revolução Francesa, a degradação e ao mesmo tempo a esperança num mundo novo mais justo, teve um grande impacto no desenvolvimento intelectual de Jomini, pois numa época de instabilidade política e de mudança de valores, Jomini desejava a estabilidade política e militar, embora participando nas Campanhas Napoleónicas da Alemanha, Espanha e Rússia. Tentava contudo, analisando eventos políticos e militares, ver qual a lógica que residia no caos político-militar vigente, além de que defendia que uma das únicas maneiras de conseguir entrar para uma carreira castrense relevante era através dos seus textos de análise militares das batalhas e de demais aspectos conexos com a arte da guerra. Determinado em se tornar um Oficial de carreira, orientou a sua educação militar autodidacta em questões estratégicas que determinam a vitória ou derrota na guerra, analisando em que medida a política influencia a conduta da guerra. Meditando sobre as razões pelas quais o sistema internacional funciona e influencia a política, reflectindo sobre a forma como deveriam ser as relações civis-militares, bem como as actividades de comando e controlo nas operações militares.
Jomini centrou os seus estudos no nível operacional da guerra, centralizando-se nos factores estratégicos que influenciam o planeamento e a conduta. Embora sabendo-se que Jomini nunca beneficiou de uma educação militar formal, e que era praticamente autodidacta em assuntos militares, porém, devido à sua formação em comércio, banca e finanças, e à sua experiência profissional na administração pública e nas indústrias de defesa, dispunha de uma bagagem cultural que lhe permitia ter uma visão transversal da sociedade da época. Esta experiência, que exigia uma abordagem pragmática e um entendimento contextual de assuntos relacionados com a guerra, deixou uma marca no seu modo de pensar, encontrando-se retratado nas suas obras.
A abordagem directa sobre as temáticas militares e a falta de formação castrense fazia com que fosse amiudadas vezes tratado como alguém “fora do circuito” pelos outros Oficiais, comportamento que Jomini atribuía à inveja resultante da sua subida vertiginosa ao estrelato, mercê do sucesso da sua primeira obra, o “Traité de Grande Tactique” e mais tarde, da sua obra literária mais emblemática, o “Précis de l’Art de la Guerre”. Ascende ao posto de General de Divisão no Exército Napoleónico, principalmente devido ao desfecho das Batalhas de Lutzen, Bautzen e Dresde, durante a Campanha da Alemanha (1813), onde o Marechal Ney6 ressalta o seu papel de planeador e estratega, com reflexos positivos e evidentes no desfecho das mesmas. O Barão Jomini viria a pedir a saída do Exército Francês agastado pelos acontecimentos conjunturais das Campanhas Napoleónicas. Após a sua retirada do Exército Francês escreve o “Histoire critique et Militaire des Campagnes de la Revolution” (1806), com novas edições em 1819 e 1824 em Paris e Bruxelas, respectivamente e o “Tableau Analytique des Principales Combinaisons de la Guerre et de leur Rapports avec la Politique des Etats”, editado em Paris (1830). Ainda sobre a vida do Imperador Napoleão, por quem tinha grande admiração, escreve o “Vie Politique et Militaire de Napoleon recontèe par lui-meme au Tribunal de César d’Alexandre et de Frederic” (1827).
Em 1815, devido à assinatura do Armistício de Poichwitz (1813) seria integrado no Exército Russo de Alexandre I, servindo como General em Chefe, e participando na comitiva russa que participou no Congresso de Viena (1815) como conselheiro militar do Imperador Alexandre. Em 1826, assiste à coroação do Imperador Nicolau II e assume a educação do Grã-Duque herdeiro da coroa russa. Ainda ao serviço da Rússia escreveu em 1843, escreve duas obras relevantes sobre a estratégia militar da Rússia, nomeadamente “La Defence de la Russie” e “La Politique Militar de la Russie”. O Barão Antoine Henri Jomini, depois de ter contribuído em vida para a organização de três Exércitos, em três nações distintas, legou a sua obra literária mais conhecida, o “Précis de l’Art de la Guerre” (1839) e viria a faleceu em 24 de Março de 1869, em Paris, tornando-se num dos estrategas militares mais estudados nas Academias Militares de todo o mundo.
Os estudos de Jomini sobre os fenómenos da Arte da Guerra.
Preocupado com os princípios que se devem adoptar no planeamento e na conduta da guerra, a sua constância e tenacidade para atingir o epíteto de estratega militar, fez com que seja merecedor de compartilhar com Clausewitz a honra de ser reconhecido mundialmente como um dos principais fundador do pensamento estratégico militar moderno. O pensamento militar de Jomini, nomeadamente as ideias expressas na sua obra magnânima, o “Précis de l’Art de la Guerre”, passaram a constituir um referencial para os assuntos relacionados com a arte da guerra. Os seus trabalhos de investigação podem ser divididos globalmente em dois grandes grupos: Históricos ou Descritivos e Teóricos ou Analíticos, não podendo ser no entanto, considerada esta divisão como exclusivista e ideológica, retratando apenas uma abordagem metodológica da sua obra para que possa ser mais facilmente entendível e contextualmente enquadrável. Com a História, o Jomini procura quase sempre de uma forma descritiva (sistemática e pormenorizada), procura encontrar os princípios ideológicos que expliquem as acções militares e, nas obras teóricas (ou analíticas) procura reforçar as suas ideologias, ilustrando-as com exemplos históricos esclarecedores, como forma de retratar as reflexões e convicções defendidas, contribuindo assim para a evolução do pensamento militar e do conhecimento sobre a arte da guerra.
Os estudos históricos abrangem cronologicamente as guerras de Frederico II da Prússia, as incidências militares da Revolução Francesa e as Campanhas Napoleónicas, desde 1792 até cerca do ano de 1815. Através da vasta bibliografia que teve ao seu dispor, Jomini desenvolveu um significativo e sistemático trabalho de investigação, graças à sua passagem pelos Exércitos Suíço, Francês e Russo, o que lhe permitiu dispor de fontes relevantes e de acesso a documentação e informação privilegiada. Na teoria militar, o seu primeiro livro, escrito entre 1805 e 1806 designado de “Traité de Grande Tactique”, fez Napoleão proferir a frase “…isto é explicar ao inimigo todo o meu sistema de guerra…”, tal era a profundidade e a clareza com que os princípios militares sobre a arte da guerra eram apresentados. No entanto, a sua mais importante obra literária, que constitui uma referência mundial na arte da guerra, haveria de ser o “Précis de l’Art de la Guerre” (1836), em que Jomini sintetiza as considerações apresentadas nas anteriores obras e apresenta as suas reflexões ao longo da vida militar sobre a arte da guerra. O livro viria a ser editado na Rússia em 1838, como manual de referência e de ensino para as Academias Militares, encontrando-se traduzida para as principais línguas modernas e chegou a ser a base do ensino militar europeu durante o Século XIX, sendo estudado actualmente em Portugal, no Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM), a par dos grandes estrategistas militares que fizeram e fazem a história da Humanidade.
A análise das suas obras sobre a arte da guerra e sobre a estratégia militar, nomeadamente nas vertentes da preparação e condução das operações militares, principalmente as extraídas do “Précis de l’Art de la Guerre”, conduz-nos ao cerne do conhecimento estratégico do pensamento militar do autor, dando-nos a conhecer o génio militar do Barão Jomini. Segundo este, a teorização da arte da guerra abrange diferentes sectores, que embora interdependentes, o autor procurou sintetizar e abordar sectorialmente. Constata-se que para cada um destes sectores, Jomini, dedica um capítulo do seu livro (ou uma parte significativa do mesmo). Os aspectos abordados e que compõem a sua obra estão organizados nos seguintes capítulos: Política da Guerra; Política Militar ou Filosofia da Guerra; Estratégia; Táctica Sublime e a Batalha; Logística e a Táctica das diversas Armas. Iremos abordar resumidamente cada uma destas temáticas, fazendo uma reflexão sobre a actualidade e a validade conceptual destes conceitos. Ciente da magnitude do seu empreendimento, Jomini refere repetidamente que não é preciso para se ser um bom Oficial das Armas (comandante de unidades de combate) aprofundar o conhecimento em todos os aspectos relacionados com a arte da guerra (mesmo antes desta acontecer). Contudo, relata que para se chegar a General ou ser um “distinto” Oficial de Estado-Maior, seria importante reter alguns dos conhecimentos transmitidos na sua obra.
No Oficial de Estado-Maior deveria residir toda a doutrina (ou conhecimento) militar, pois é a este que lhe está, por inerência de funções, incumbida a nobre tarefa de estudar os fenómenos da guerra e de reflectir sobre as incidências no combate, elaborando os estudos que fundamentam e apoiam as decisões militares. Sendo importante também o estudo da história, pois por esta via seria possível retirar lições e aprender com os erros cometidos, tendo em vista incorporar os ensinamentos no planeamento operacional das campanhas militares em planeamento ou em curso. Importa referir que o estudo de diferentes acções militares, comuns à Táctica e à Estratégia, nomeadamente quando aprofunda no estudo da “Retirada” e da “Arte dos Engenheiros”, e mais precisamente como apoio à manobra das forças militares, embora não incluídos entre as Armas e o ataque ou defesa de “Praças de Guerra”, bem ainda como do estudo das diferentes formações dos Exércitos para as marchas, que embora não abordados detalhadamente nesta reflexão, constituem exemplo do vasto campo de matérias em que a reflexão estratégica e a doutrina militar de Jomini abordou.
Com a designação de “Política de Guerra”, Jomini adopta um conceito que permite elevar os aspectos relacionados com a guerra ao nível da decisão política, ao nível das decisões de Estado. Nesse contexto, e referindo-se aos critérios estruturantes que servem a um “homem de Estado”, ou seja, a quem cabe os destinos de uma nação para julgar a necessidade e a conveniência de uma guerra e, se necessário, determinar as operações militares no intuito de atingir os objectivos determinados em nome do superior interesse nacional. Define que as razões para começar uma guerra podem ser múltiplas, contudo e uma vez decidida a necessidade e a declaração da guerra, as operações militares a adoptar podem diferir grandemente segundo os objectivos a atingir8. O Barão Jomini estuda neste contexto, os vários tipos de guerra que dependentemente das opções político-estrategicas adoptadas podem ser conduzidas, referindo-se ao que designou por Guerras Ofensivas para Reclamar Direitos, Guerras Defensivas, Guerras de Intervenção, Guerras de Invasão, Guerras de Opinião, Guerras Nacionais, Guerras Civis e Guerras Duplas. Refere a este propósito que é contraproducente manter duas grandes guerras simultaneamente, mas se existir a necessidade de o fazer (e se possível), deve-se aguardar o fim da guerra em curso antes de começar uma outra. A reflexão sobre a divisibilidade dos recursos e a não concentração dos meios ao dispor de uma nação num determinando objectivo, exercendo-se aí o esforço de guerra (designando-se por esforço principal), pode ser ilustrado na história recente pela intervenção Portuguesa nos cinco Teatro de Operações em África na Guerra Colonial e mais recentemente da intervenção simultânea dos Estados Unidos da América nos conflitos do Iraque e Afeganistão.
De difícil conceptualização, Jomini defende que as consideradas “Guerras de Conveniência” são no seu entender, de capital importância para não suscitar o interesse de um terceiro país que se possa coligar com o país atacado e aliados, e constituírem-se numa ameaça reforçada, visando desta forma impedir a criação de alianças militares oportunistas que, no seu entender, podem enfraquecer a nossa posição geoestratégica numa determinada conjuntura. As designadas “Guerras Defensivas”, aquelas onde se concentram os recursos da nação na defesa do território (ou dos seus interesses) são as que do ponto de vista militar podemos tirar maior vantagens, pois ao levar a efeito operações militares no próprio território, temos a nítido favor o conhecimento sobre os obstáculos naturais e artificiais existentes, o apoio da população e das autoridades civis, bem como o conhecimento do terreno, factores que ao serem capitalizados nos estudos de Estado-Maior, dariam origem a planos de defesa e permitiam acautelar a nossa invasão por parte de um outro país. Jomini, neste aspecto particular, faz-nos reflectir superficialmente sobre a legitimidade da guerra, afirmando que a Guerra de Intervenção e de acordo com os seus propósitos, é considerada vantajosa e “legítima”, facto que sendo discutível à luz das actuais convenções internacionais, nunca deixou de ser uma constante no Sistema Político Internacional.
As Guerras de Intervenção podem ser as mais vantajosas, pois pode-se entrar nelas quando se quiser, estando do nosso lado o factor “surpresa”, e permitindo colocar todo o peso do poder próprio (todos os meios disponíveis a empregar numa guerra) a favor do país coligado (quando for o caso). A finalidade deste tipo de guerra pode ser a de influir nos negócios interiores dos países vizinhos (o que tal como refere Jomini, nem sempre será positivo), interferindo nas relações externas de terceiros países quando se perspectivar que possam interferir nos nossos interesses e que se possam constituir uma ameça no futuro próximo. Neste contexto, são três as principais causas que podem tornar necessária a intervenção, nomeadamente através das obrigações derivadas de Tratados e de Alianças político-militares (o que acontece actualmente com Portugal por via da sua adesão à UE e à NATO), a conservação do equilíbrio político, impedindo desta forma, o crescimento excessivo de um país e, para tirar proveito das conjunturas de oportunidade. Para ser bem-sucedidas neste tipo de conflitos é importante escolher para o comando do Exército um General que, para além de militar, seja também político, que tenha uma visão estratégica da guerra e saiba alinhar os interesses políticos da nação com o engenho e a arte militar operacional, segundo o autor, deve ainda designar o grau de empenhamento de cada parte da coligação (nação) e estabelecer objectivos realistas em consonância com os interesses comuns (nacionais). Jomini reafirma que esquecer estas condições e premissas pode conduzir à derrota na batalha, ao insucesso de uma campanha militar e à destruição de uma nação.
Relativamente às designadas “Guerras de Invasão”, assevera que quando não houver um motivo para as fazer, este tipo de guerra é própria de bárbaros, contudo, também assegura que se houver justificação, derivado de um superior interesse nacional e de objectivo louvável, então pode merecer a aprovação. Embora refira que fosse desejável o seu desaparecimento, Jomini, considera que é melhor invadir do que ser invadido, podendo, porem ser considerado um grande inconveniente o moral e a ânsia de liberdade do povo invadido. As “Guerras de Opinião” podem ser causadas por dogmas políticos ou religiosos, em que o autor considera que a religião constitui-se num pretexto para alcançar determinados objectivos políticos. A defesa do dogma torna-se precisa para a dupla função de “excitar as paixões” dos próprios e ganhar adeptos entre a população do inimigo. As designadas “Guerras Nacionais” acontecem quando os passos dados supõem um confronto de forças em que o invasor apenas tem a posse ou controlo sobre o terreno que pisa e o reabastecimento é feito pela força, sob terreno controlado pelo inimigo, em que os trens logísticos são atacados com frequência. Refere ainda que se o país invadido dispõe de um Exército regular, as dificuldades serão muito maiores, porque não só deve preocupar-se com os combates convencionais, mas também com as guerrilhas (combate não convencional). As “Guerras Civis” normalmente são causadas por motivos políticos ou religiosos, havendo a necessidade de ter em conta apenas a máxima de rejeitar a intervenção de qualquer outro país que unicamente pretenda tirar proveitos para si próprio.
A Revolução Francesa e mais concretamente as Campanhas Napoleónicas, que se prolongaram entre 1796 e 1815, são referidas por muitos pensadores militares como os principais acontecimentos charneira que determinaram, a forma de estudar a arte da guerra. Não só pela preponderância do génio militar de Napoleão e do seu corpo de Generais, mas principalmente pela repercussão que estas campanhas militares épicas tiveram na doutrina táctica e na estratégia militar. De um período histórico em que a actividade bélica constituía um assunto privado dos soberanos e dos seus Exércitos, em que apenas estes estavam vocacionados para reflectir e escrever sobre a arte da guerra, passaram a existir outros intervenientes. Esta actividade passou a constituir tema de reflexão social e motivo de escritos académicos. A guerra passou a ser um assunto transversal no seio das sociedades, envolvendo múltiplos actores conjunturais. Conflitos que mobilizavam as nações e a sua população por inteiro, retratado no lema proferido por Napoleão “…levée en masse…”. Passava a assistir-se à inclusão de um inovador conceito de “liberalismo militar”, extremado na essência de um “militarismo liberal que inundava o pensamento de políticos, sociólogos, historiadores e estrategas militares.
Decorrentes das Campanhas Napoleónicas, cujos efeitos directos e indirectos assolaram a maioria dos países da Europa no início do Século XIX, surgem diversos teorizadores e pedagogos da arte da guerra. Destes importa destacar, pela profundidade das suas obras e pela relevância do seu pensamento, duas personagens que marcaram uma época e contribuíram para a conceptualização de uma doutrina estratégica e militar inovadora - Carl Philipp Gottlieb von Clausewitz e o Barão Antoine Henri Jomini. Embora tenham ambos ascendido ao posto de General, nunca chegaram a comandar tropas em combate, desempenhando essencialmente funções de Estado-Maior e de assessoria político-militar ao mais alto nível, principalmente no Exército Prussiano e no Exército Francês, respectivamente, tendo ambos, em determinado período da sua vida militar servido no Exército Russo. Contudo, resultante da experiência acumulada no desempenho destas distintas funções, beneficiou de uma partilha de conhecimentos e de uma visão estratégica das operações da guerra, inclusive na vertente logística e jurídica, o que aliado ao espírito critico, analítico e indutivo, bem como ao apurado estudo histórico das batalhas e das campanhas militares, permitiu que compusessem obras respeitantes ao estudo da guerra, cujo teor, princípios e clareza das visões apresentadas, salvaguardando as devidas actualizações resultantes da evolução tecnológica e das ideologias modernas, se mantêm actuais e se constituem em grande medida, nas linhas orientadoras de planeamento e de conduta dos Exércitos modernos em operações militares.
Antoine Henri Jomini, cuja vida, obra e legado pensamento estratégico, pontificam no dia-a-dia de muitos manuais de estratégia militar, não parece ter recebido o reconhecimento e protagonismo que poderia merecer. Esta reflexão que aqui partilhamos é uma oportunidade para descobrir o génio militar de Jomini, e é simultaneamente uma dedicatória ao seu protagonismo como homem, estadista e militar, pois que as suas contribuições no campo da Estratégia3, da Táctica4, da Arte Operacional e da Logística5 (termo de sua autoria), a sua criação de modelos de análise, a sua capacidade de antevisão e o seu conceito inovador das relações civis-militares, que serão objecto de análise, constituem o seu referencial ideológico sobre a arte da guerra. Dada a contemporaneidade com Clausewitz, bem como a grandeza das suas obras e ainda a forma como estes dois estrategistas complementaram os seus pensamentos estratégicos, é de capital importância verificar que, embora tenham combatido em facções opostas das Campanhas Napoleónicas, alguns dos seus principais conceitos gerais e ideologias sobre a conduta operacional das batalhas, se aproximam ou mesmo coincidem, noutros divergem e outros há ainda em que se complementam.
Um breve apontamento biográfico
O Barão Antoine Henri Jomini nasceu a 6 de Março de 1779, na localidade de Payerne, na Suíça (República Helvética). Desde cedo revelou inclinação pela carreira militar, mas tanto o pedido do seu pai, um político regional e nacional, como os acontecimentos conjunturais resultantes da Revolução Francesa, demoveram-no do seu objectivo, optando antes por se tornar um economista e banqueiro. Para tal, recebeu formação em finanças e actividades bancárias nas cidades de Aarau e Basel, tendo posteriormente rumado a Paris onde trabalhou na banca durante cerca de dois anos. Após este curto período, decidiu tentar a sua sorte como corrector na Bolsa de Paris em 1798, durante o qual ficou fortemente influenciado pelos nobres ideais da Revolução Francesa e deslumbrado pelos feitos militares conseguido por Napoleão Bonaparte. Redige em Paris o “Jornal des Operations Militaires” e o “Histoire critique et militaire des Campagnes de la Révolution, de 1792 à 1801”, tendo como base a observação atenta das manobras militares. Estas obras constituíram-se nas primeiras referências bibliografias relacionada com a sua reflexão sobre o fenómeno da guerra. Entretanto, na Suíça, as tropas francesas tinham libertado zonas subjugadas por regimes aristocráticos e imposta uma Constituição Republicana e um Governo Central à Confederação Suíça. Aos vinte anos, em 1799, Jomini ingressou no Ministério da Guerra da recém- criada República Helvética como tenente Ajudante de Campo do Ministro da Guerra Helvético, vindo a ser promovido a capitão em 17 de Junho desse mesmo ano, e assumindo a função de Chefe de Secretaria do Ministério da Guerra Helvético, onde se dedicou à criação, organização e administração de um novo Exército para a defesa de uma Suíça devastada pela guerra civil, tendo publicado neste período os seus primeiros escritos militares sobre o Exército Helvético em 1800.
Em 1801, Jomini ruma novamente a Paris, com o propósito de finalmente ingressar na carreira militar, altura em que recomeça as suas pesquisas em História Militar e mais concretamente no estudo de batalhas, escrevendo sobre a Arte da Guerra, a sua primeira obra de referência internacional, o “Traité de Grande Tactique”, mais tarde apelidado de “Traité des Grandes Opérations Militaires”, editado em 5 volumes, em 1805. É porém o Marechal Michael Ney que ao ler o manuscrito de Jomini sobre o “Traité de Grande Tactique”, em 1804, resolve apoiar a sua publicação, propondo ainda a sua nomeação para integrar o seu Estado-Maior como Ajudante de Campo Adjunto, proporcionando-lhe a oportunidade de iniciar uma carreira militar. Veio a juntar-se ao Estado-Maior do Marechal Michael Ney em 3 de Março de 1805, revelando-se sob o seu comando, um exímio planeador e um estratega militar de referência.
O ambiente da Revolução Francesa, a degradação e ao mesmo tempo a esperança num mundo novo mais justo, teve um grande impacto no desenvolvimento intelectual de Jomini, pois numa época de instabilidade política e de mudança de valores, Jomini desejava a estabilidade política e militar, embora participando nas Campanhas Napoleónicas da Alemanha, Espanha e Rússia. Tentava contudo, analisando eventos políticos e militares, ver qual a lógica que residia no caos político-militar vigente, além de que defendia que uma das únicas maneiras de conseguir entrar para uma carreira castrense relevante era através dos seus textos de análise militares das batalhas e de demais aspectos conexos com a arte da guerra. Determinado em se tornar um Oficial de carreira, orientou a sua educação militar autodidacta em questões estratégicas que determinam a vitória ou derrota na guerra, analisando em que medida a política influencia a conduta da guerra. Meditando sobre as razões pelas quais o sistema internacional funciona e influencia a política, reflectindo sobre a forma como deveriam ser as relações civis-militares, bem como as actividades de comando e controlo nas operações militares.
Jomini centrou os seus estudos no nível operacional da guerra, centralizando-se nos factores estratégicos que influenciam o planeamento e a conduta. Embora sabendo-se que Jomini nunca beneficiou de uma educação militar formal, e que era praticamente autodidacta em assuntos militares, porém, devido à sua formação em comércio, banca e finanças, e à sua experiência profissional na administração pública e nas indústrias de defesa, dispunha de uma bagagem cultural que lhe permitia ter uma visão transversal da sociedade da época. Esta experiência, que exigia uma abordagem pragmática e um entendimento contextual de assuntos relacionados com a guerra, deixou uma marca no seu modo de pensar, encontrando-se retratado nas suas obras.
A abordagem directa sobre as temáticas militares e a falta de formação castrense fazia com que fosse amiudadas vezes tratado como alguém “fora do circuito” pelos outros Oficiais, comportamento que Jomini atribuía à inveja resultante da sua subida vertiginosa ao estrelato, mercê do sucesso da sua primeira obra, o “Traité de Grande Tactique” e mais tarde, da sua obra literária mais emblemática, o “Précis de l’Art de la Guerre”. Ascende ao posto de General de Divisão no Exército Napoleónico, principalmente devido ao desfecho das Batalhas de Lutzen, Bautzen e Dresde, durante a Campanha da Alemanha (1813), onde o Marechal Ney6 ressalta o seu papel de planeador e estratega, com reflexos positivos e evidentes no desfecho das mesmas. O Barão Jomini viria a pedir a saída do Exército Francês agastado pelos acontecimentos conjunturais das Campanhas Napoleónicas. Após a sua retirada do Exército Francês escreve o “Histoire critique et Militaire des Campagnes de la Revolution” (1806), com novas edições em 1819 e 1824 em Paris e Bruxelas, respectivamente e o “Tableau Analytique des Principales Combinaisons de la Guerre et de leur Rapports avec la Politique des Etats”, editado em Paris (1830). Ainda sobre a vida do Imperador Napoleão, por quem tinha grande admiração, escreve o “Vie Politique et Militaire de Napoleon recontèe par lui-meme au Tribunal de César d’Alexandre et de Frederic” (1827).
Em 1815, devido à assinatura do Armistício de Poichwitz (1813) seria integrado no Exército Russo de Alexandre I, servindo como General em Chefe, e participando na comitiva russa que participou no Congresso de Viena (1815) como conselheiro militar do Imperador Alexandre. Em 1826, assiste à coroação do Imperador Nicolau II e assume a educação do Grã-Duque herdeiro da coroa russa. Ainda ao serviço da Rússia escreveu em 1843, escreve duas obras relevantes sobre a estratégia militar da Rússia, nomeadamente “La Defence de la Russie” e “La Politique Militar de la Russie”. O Barão Antoine Henri Jomini, depois de ter contribuído em vida para a organização de três Exércitos, em três nações distintas, legou a sua obra literária mais conhecida, o “Précis de l’Art de la Guerre” (1839) e viria a faleceu em 24 de Março de 1869, em Paris, tornando-se num dos estrategas militares mais estudados nas Academias Militares de todo o mundo.
Os estudos de Jomini sobre os fenómenos da Arte da Guerra.
Preocupado com os princípios que se devem adoptar no planeamento e na conduta da guerra, a sua constância e tenacidade para atingir o epíteto de estratega militar, fez com que seja merecedor de compartilhar com Clausewitz a honra de ser reconhecido mundialmente como um dos principais fundador do pensamento estratégico militar moderno. O pensamento militar de Jomini, nomeadamente as ideias expressas na sua obra magnânima, o “Précis de l’Art de la Guerre”, passaram a constituir um referencial para os assuntos relacionados com a arte da guerra. Os seus trabalhos de investigação podem ser divididos globalmente em dois grandes grupos: Históricos ou Descritivos e Teóricos ou Analíticos, não podendo ser no entanto, considerada esta divisão como exclusivista e ideológica, retratando apenas uma abordagem metodológica da sua obra para que possa ser mais facilmente entendível e contextualmente enquadrável. Com a História, o Jomini procura quase sempre de uma forma descritiva (sistemática e pormenorizada), procura encontrar os princípios ideológicos que expliquem as acções militares e, nas obras teóricas (ou analíticas) procura reforçar as suas ideologias, ilustrando-as com exemplos históricos esclarecedores, como forma de retratar as reflexões e convicções defendidas, contribuindo assim para a evolução do pensamento militar e do conhecimento sobre a arte da guerra.
Os estudos históricos abrangem cronologicamente as guerras de Frederico II da Prússia, as incidências militares da Revolução Francesa e as Campanhas Napoleónicas, desde 1792 até cerca do ano de 1815. Através da vasta bibliografia que teve ao seu dispor, Jomini desenvolveu um significativo e sistemático trabalho de investigação, graças à sua passagem pelos Exércitos Suíço, Francês e Russo, o que lhe permitiu dispor de fontes relevantes e de acesso a documentação e informação privilegiada. Na teoria militar, o seu primeiro livro, escrito entre 1805 e 1806 designado de “Traité de Grande Tactique”, fez Napoleão proferir a frase “…isto é explicar ao inimigo todo o meu sistema de guerra…”, tal era a profundidade e a clareza com que os princípios militares sobre a arte da guerra eram apresentados. No entanto, a sua mais importante obra literária, que constitui uma referência mundial na arte da guerra, haveria de ser o “Précis de l’Art de la Guerre” (1836), em que Jomini sintetiza as considerações apresentadas nas anteriores obras e apresenta as suas reflexões ao longo da vida militar sobre a arte da guerra. O livro viria a ser editado na Rússia em 1838, como manual de referência e de ensino para as Academias Militares, encontrando-se traduzida para as principais línguas modernas e chegou a ser a base do ensino militar europeu durante o Século XIX, sendo estudado actualmente em Portugal, no Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM), a par dos grandes estrategistas militares que fizeram e fazem a história da Humanidade.
A análise das suas obras sobre a arte da guerra e sobre a estratégia militar, nomeadamente nas vertentes da preparação e condução das operações militares, principalmente as extraídas do “Précis de l’Art de la Guerre”, conduz-nos ao cerne do conhecimento estratégico do pensamento militar do autor, dando-nos a conhecer o génio militar do Barão Jomini. Segundo este, a teorização da arte da guerra abrange diferentes sectores, que embora interdependentes, o autor procurou sintetizar e abordar sectorialmente. Constata-se que para cada um destes sectores, Jomini, dedica um capítulo do seu livro (ou uma parte significativa do mesmo). Os aspectos abordados e que compõem a sua obra estão organizados nos seguintes capítulos: Política da Guerra; Política Militar ou Filosofia da Guerra; Estratégia; Táctica Sublime e a Batalha; Logística e a Táctica das diversas Armas. Iremos abordar resumidamente cada uma destas temáticas, fazendo uma reflexão sobre a actualidade e a validade conceptual destes conceitos. Ciente da magnitude do seu empreendimento, Jomini refere repetidamente que não é preciso para se ser um bom Oficial das Armas (comandante de unidades de combate) aprofundar o conhecimento em todos os aspectos relacionados com a arte da guerra (mesmo antes desta acontecer). Contudo, relata que para se chegar a General ou ser um “distinto” Oficial de Estado-Maior, seria importante reter alguns dos conhecimentos transmitidos na sua obra.
No Oficial de Estado-Maior deveria residir toda a doutrina (ou conhecimento) militar, pois é a este que lhe está, por inerência de funções, incumbida a nobre tarefa de estudar os fenómenos da guerra e de reflectir sobre as incidências no combate, elaborando os estudos que fundamentam e apoiam as decisões militares. Sendo importante também o estudo da história, pois por esta via seria possível retirar lições e aprender com os erros cometidos, tendo em vista incorporar os ensinamentos no planeamento operacional das campanhas militares em planeamento ou em curso. Importa referir que o estudo de diferentes acções militares, comuns à Táctica e à Estratégia, nomeadamente quando aprofunda no estudo da “Retirada” e da “Arte dos Engenheiros”, e mais precisamente como apoio à manobra das forças militares, embora não incluídos entre as Armas e o ataque ou defesa de “Praças de Guerra”, bem ainda como do estudo das diferentes formações dos Exércitos para as marchas, que embora não abordados detalhadamente nesta reflexão, constituem exemplo do vasto campo de matérias em que a reflexão estratégica e a doutrina militar de Jomini abordou.
Com a designação de “Política de Guerra”, Jomini adopta um conceito que permite elevar os aspectos relacionados com a guerra ao nível da decisão política, ao nível das decisões de Estado. Nesse contexto, e referindo-se aos critérios estruturantes que servem a um “homem de Estado”, ou seja, a quem cabe os destinos de uma nação para julgar a necessidade e a conveniência de uma guerra e, se necessário, determinar as operações militares no intuito de atingir os objectivos determinados em nome do superior interesse nacional. Define que as razões para começar uma guerra podem ser múltiplas, contudo e uma vez decidida a necessidade e a declaração da guerra, as operações militares a adoptar podem diferir grandemente segundo os objectivos a atingir8. O Barão Jomini estuda neste contexto, os vários tipos de guerra que dependentemente das opções político-estrategicas adoptadas podem ser conduzidas, referindo-se ao que designou por Guerras Ofensivas para Reclamar Direitos, Guerras Defensivas, Guerras de Intervenção, Guerras de Invasão, Guerras de Opinião, Guerras Nacionais, Guerras Civis e Guerras Duplas. Refere a este propósito que é contraproducente manter duas grandes guerras simultaneamente, mas se existir a necessidade de o fazer (e se possível), deve-se aguardar o fim da guerra em curso antes de começar uma outra. A reflexão sobre a divisibilidade dos recursos e a não concentração dos meios ao dispor de uma nação num determinando objectivo, exercendo-se aí o esforço de guerra (designando-se por esforço principal), pode ser ilustrado na história recente pela intervenção Portuguesa nos cinco Teatro de Operações em África na Guerra Colonial e mais recentemente da intervenção simultânea dos Estados Unidos da América nos conflitos do Iraque e Afeganistão.
De difícil conceptualização, Jomini defende que as consideradas “Guerras de Conveniência” são no seu entender, de capital importância para não suscitar o interesse de um terceiro país que se possa coligar com o país atacado e aliados, e constituírem-se numa ameaça reforçada, visando desta forma impedir a criação de alianças militares oportunistas que, no seu entender, podem enfraquecer a nossa posição geoestratégica numa determinada conjuntura. As designadas “Guerras Defensivas”, aquelas onde se concentram os recursos da nação na defesa do território (ou dos seus interesses) são as que do ponto de vista militar podemos tirar maior vantagens, pois ao levar a efeito operações militares no próprio território, temos a nítido favor o conhecimento sobre os obstáculos naturais e artificiais existentes, o apoio da população e das autoridades civis, bem como o conhecimento do terreno, factores que ao serem capitalizados nos estudos de Estado-Maior, dariam origem a planos de defesa e permitiam acautelar a nossa invasão por parte de um outro país. Jomini, neste aspecto particular, faz-nos reflectir superficialmente sobre a legitimidade da guerra, afirmando que a Guerra de Intervenção e de acordo com os seus propósitos, é considerada vantajosa e “legítima”, facto que sendo discutível à luz das actuais convenções internacionais, nunca deixou de ser uma constante no Sistema Político Internacional.
As Guerras de Intervenção podem ser as mais vantajosas, pois pode-se entrar nelas quando se quiser, estando do nosso lado o factor “surpresa”, e permitindo colocar todo o peso do poder próprio (todos os meios disponíveis a empregar numa guerra) a favor do país coligado (quando for o caso). A finalidade deste tipo de guerra pode ser a de influir nos negócios interiores dos países vizinhos (o que tal como refere Jomini, nem sempre será positivo), interferindo nas relações externas de terceiros países quando se perspectivar que possam interferir nos nossos interesses e que se possam constituir uma ameça no futuro próximo. Neste contexto, são três as principais causas que podem tornar necessária a intervenção, nomeadamente através das obrigações derivadas de Tratados e de Alianças político-militares (o que acontece actualmente com Portugal por via da sua adesão à UE e à NATO), a conservação do equilíbrio político, impedindo desta forma, o crescimento excessivo de um país e, para tirar proveito das conjunturas de oportunidade. Para ser bem-sucedidas neste tipo de conflitos é importante escolher para o comando do Exército um General que, para além de militar, seja também político, que tenha uma visão estratégica da guerra e saiba alinhar os interesses políticos da nação com o engenho e a arte militar operacional, segundo o autor, deve ainda designar o grau de empenhamento de cada parte da coligação (nação) e estabelecer objectivos realistas em consonância com os interesses comuns (nacionais). Jomini reafirma que esquecer estas condições e premissas pode conduzir à derrota na batalha, ao insucesso de uma campanha militar e à destruição de uma nação.
Relativamente às designadas “Guerras de Invasão”, assevera que quando não houver um motivo para as fazer, este tipo de guerra é própria de bárbaros, contudo, também assegura que se houver justificação, derivado de um superior interesse nacional e de objectivo louvável, então pode merecer a aprovação. Embora refira que fosse desejável o seu desaparecimento, Jomini, considera que é melhor invadir do que ser invadido, podendo, porem ser considerado um grande inconveniente o moral e a ânsia de liberdade do povo invadido. As “Guerras de Opinião” podem ser causadas por dogmas políticos ou religiosos, em que o autor considera que a religião constitui-se num pretexto para alcançar determinados objectivos políticos. A defesa do dogma torna-se precisa para a dupla função de “excitar as paixões” dos próprios e ganhar adeptos entre a população do inimigo. As designadas “Guerras Nacionais” acontecem quando os passos dados supõem um confronto de forças em que o invasor apenas tem a posse ou controlo sobre o terreno que pisa e o reabastecimento é feito pela força, sob terreno controlado pelo inimigo, em que os trens logísticos são atacados com frequência. Refere ainda que se o país invadido dispõe de um Exército regular, as dificuldades serão muito maiores, porque não só deve preocupar-se com os combates convencionais, mas também com as guerrilhas (combate não convencional). As “Guerras Civis” normalmente são causadas por motivos políticos ou religiosos, havendo a necessidade de ter em conta apenas a máxima de rejeitar a intervenção de qualquer outro país que unicamente pretenda tirar proveitos para si próprio.
Convidado- Convidado
Re: Estratégia militar
Texto interessante.. bem legal..
Você já leu Sun Tzu? O cara era um gênio em relação à estratégia militar..
Você já leu Sun Tzu? O cara era um gênio em relação à estratégia militar..
Victor Renzo- Membro
- Mensagens : 128
Data de inscrição : 23/09/2012
Re: Estratégia militar
Já li.
Também acho-no um gênio
Achei que o texto ficou trincado, vou postar textos mais leves nas próximas vezes.
Tem um livro chamado 'O Livro dos Jovens' que imagino que vá gostar de ler também.
Também acho-no um gênio
Achei que o texto ficou trincado, vou postar textos mais leves nas próximas vezes.
Tem um livro chamado 'O Livro dos Jovens' que imagino que vá gostar de ler também.
Convidado- Convidado
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